segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Victor e as razões de Brecht.

Por Ricardo Lacerda


Saí do Olímpico com uma sensação esquisita. Apesar da elástica vitória de 4 a 1 sobre o Flamengo, nem de longe podemos falar em passeio ou banho de bola. É justo destacar a presença de área de Perea, a habilidade de Rever, e até mesmo a competência de Jonas. No entanto, a maior justiça, ainda bem, já está sendo feita exaustivamente desde que acabou a partida. Victor transcendeu o estado de inspiração. Até porque inspirado ele já é, ao natural. Neste domingo atípico de inverno, o sol de 34 graus abrilhantou uma carreira em franca e vigorosa ascensão.

Victor é um dos maiores expoentes do Grêmio desde que chegou, no começo do ano passado. Foi eleito o melhor goleiro do Brasileirão 2008 e acabou sendo convocado à Seleção. Justo. Agora, retornemos ao jogo deste domingo, quando Victor foi erguido a um pedestal e colocado ao lado de outros poucos heróis. Lembrei de uma frase do dramaturgo alemão Bertolt Brecht, algo do tipo "povo infeliz aquele que não tem heróis". Exatamente assim, infelizes, voltaríamos para as nossas casas depois do jogo caso não existisse Victor. Depois, rememorei o complemento da frase anterior, algo que a deixa paradoxal: "povo infeliz aquele que precisa de heróis". Ora, a existência de heróis, então, é boa o ruim?

Brecht, que já virou pó faz uns 60 anos, me deixou com a pulga atrás da orelha. Queremos Victor sempre herói, como neste domingo, ou é melhor tê-lo ali, à disposição, mas sem precisar praticar heroísmos? Goleiro deveria que ser igual a bombeiro: quanto menos trabalhar, melhor. Victor vem labutando além do habitual. Abusam de sua boa vontade. Altruísta, neste domingo fez mais que sua parte dele: salvou a pele duma galera. Imaginem se os chutes de Adriano, Emerson e outros tivessem entrado - algo até normal para times "mortais". Certamente a segunda-feira chuvosa amanheceria tensa e ainda mais nebulosa. Os 4 a 1 esconderam uma sucessão de erros defensivos. Pontuais, é verdade - ou seja, passíveis de correção. Menos mal.

O time armado por Autuori trouxe uma formação diferente da normal. Rafa Marques, felizmente, voltou ao time. Rever foi bem na volância. Jadílson nos fez querer que Lúcio desembarque logo, e Bruno Collaço serviu de alento. Mário mostrou que pode ser lateral, sim. Túlio cobrou faltas e escanteios, mas não é garçom. Perea, depois de oito meses parado, parece que pode ser bom parceiro para Maxi Lopez. Douglas vai ganhando ritmo, e, num time todo modificado, chamou a responsabilidade. Jonas, bem... para mim, ainda é Jonas. Mesmo sendo "o artilheiro da temporada", não deveria ser titular. Souza e Maxi são diferenciados e, voltando, acrescem muito. Tcheco é um caso à parte: seus defensores dizem que o time não funciona sem ele. Discordo. Com Victor de capitão, a equipe me pareceu mais tranquila. Quase não houve atrito com arbitragem. Ainda assim, capitanear um barco sob apenas um ponto de vista, o do gol, não é a melhor solução. Sugiro, novamente, Rever com a braçadeira.

Não sei com que sentimento encerro este domingo. Fico feliz por termos Victor. Ao mesmo tempo, fico preocupado em vê-lo tendo de operar milagres. Por mim, o ideal seria ter Victor como mero observador. Não é de hoje que os da linha estão em dívida com ele. Deveriam aproveitar o entreato que é o encerramento do primeiro turno e pensar numa maneira de zerar a conta. Victor merece descanso durante os jogos. Merece mais: num calorão tipo este que fez domingo, deveria apenas assistir a Pereas e Jonas fazerem os gols. Enquanto isso, bem que algum outro - quem sabe Tcheco - poderia ficar servindo uma ceva gelada ao herói da meta tricolor. Afinal, ele merece.

Atormentado com o pensamento de Brecht, me voy.

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